Hoje a minha mãe faria anos. O meu pai compraria as flores e eu o presente, como sempre. O dia será marcado pela visita da minha avó à sua campa, à qual não tive coragem de voltar desde o seu enterro, embora mentalmente relembre a posição exacta onde se encontra. Nunca cultivei o culto dos mortos, e não o abracei após a morte da minha mãe. Nunca será uma lápide com uma cova na terra por baixo que me lembrará dela. Ela está em tudo o que faço, em cada lembrança, em cada sonho recorrente. A minha mãe está viva em mim, e basta-me olhar para o espelho para a ver. Nestas datas custa mais, custa sempre mais, e a saudade aperta com uma força que quase deixo de respirar. Mas depois lembro-me como ela era, sempre alegre e encarando a vida de frente, e lamento que tenha saído ao lado mais soturno da família, deixando cair a noite em mim tão facilmente. Hoje seria dia de festa. Não será, certamente, mas tentarei lembrar-me o quando ela gostava de celebrar a vida, e como gostaria que continuássemos a fazê-lo. Mesmo sem ela.