19 de agosto de 2009

Aquela amiga

Quase toda a gente tem uma amiga porreira, inteligente, divertida, com piada, que gosta de sair e de festa, comunicativa e sociável, conhecida pelo seu sentido de humor peculiar, que viaja e tem sempre histórias para contar, que tem a sua vida e o seu trabalho, a sua casa, que é independente e aventureira, que, não sendo nenhuma top model, até é gira e engraçada, sem nenhum defeito visível, mas que, por alguma razão que ninguém conhece ou compreende, é uma eterna solteira. Conhecem-se-lhe alguns casos, coisas passageiras, umas mais desastrosas que outras, mas raras relações sérias e duradouras. Às inevitáveis perguntas de amigos e família, encolhe os ombros, já há muito tendo deixado de procurar explicações que não existem, mais para satisfazer os outros que a si própria. Os amigos mais próximos, já se habituaram, tendo por isso deixado o péssimo hábito de lhe tentarem arranjar arranjinhos, embora os novos por vezes ainda incorram nesse erro, por não entenderem que possa estar sozinha e bem, sem ansiedades. Se lhe perguntam se ainda espera, e cair no erro de responder que sim, olham-na então com uma certa comiseração, como se lhe faltasse um bracinho, ou uma perninha, razão pela qual acaba quase sempre por optar pelo caminho mais fácil, respondendo que está habituada a estar sozinha - que está -, e que gosta da sua independência - que também gosta -, embora ocultando que não se importaria de ter companhia, desde que boa, e não apenas por comodismo ou falta de melhor. Quase toda a gente tem uma amiga assim, que escapa à compreensão dos demais, nem se encaixa na nossa percepção de normalidade social, onde o singular é encarado com desconfiança face ao conforto dos pares. Essa amiga sou eu.

47 comentários:

  1. Querida Luna, este texto serviu como uma luva. Serve ainda a muitas outras mulheres que conheço.

    O que por si já é bom, mais que não seja para constatar que a normalidade é, como em direito classificamos, um conceito indeterminado.

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  2. Belo texto! Gostava de ter este teu dom para (tão bem) escrever e expressar sentimentos/vivências/realidades.

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  3. E eu! com a diferença que já te levo uns bons anos de avanço ...

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  4. "mira que linda es tu dignidad en pie" tango do piazzola. grande texto este miuda. muito bem.

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  5. Oh Luna, que belo texto. Essa amiga também sou eu. E muitas das minhas amigas.

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  6. Ah! E eu! :)
    E ainda sofro com ciúmes infundados das namoradas de alguns amigos :)

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  7. Antes de me dedicar à blogoesfera pensava que na realidade era diferente visto que entre o grupo de amigas e colegas eu era a única independente e que ia (loucura das loucuras....) viajar sozinha....Agora dou por mim a ver que não sou a ÚNICA e que até há pessoas bastante interessantes e que também não vivem dentro dos pârametros standarizados pela sociedade. Esta pressão continua no meu dia a dia, e habituei-me a não dar muita importância (porque não tem) mas é bom saber que estou acompanhada. Muito bem escrito Luna....

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  8. Eu também podia ser perfeitamente essa miúda.... :) beijocas

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  9. ;) tudo tem o seu tempo, quando menos esperares puff

    Beijinho***

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  10. Bom, não seja por isso. Sai mais uma a quem o texto assentou como uma luva. :-D

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  11. Já não sou essa amiga, mas fui durante muitos anos e continuo a gostar da minha independência, apesar do meu esposo, que também não se chateia com isso. Nunca me senti mal por estar sozinha, tinha muitos amigos, vivi muitas coisas que provavelmente se tivesse namorado, não me teria dado para fazer. A unica altura em que realmente me sentia triste com isso, era quando alguém da família me vinha com esse "olhar" do entãaao não há namorado? Como se tivesse algum tipo de deficiência. Continuo a achar uma patetice achar-se que mulher sozinha é infeliz.

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  12. Caramba! Descreveste-me na perfeição. Gostei especialmente da parte onde dizes que os singulares são olhados com desconfiaça num mundo de pares. É isso mesmo.

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  13. Brilhante, Luna.

    Somos tantas...muitas...(QUASE) todas as que por aqui passam.
    Começo a perceber que o problema afinal não é so meu.

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  14. :p O mundo está cheio de miúdas giras e inteligentes e.... será que estas miúdas metem medo ao outro género? :p

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  15. esqueceste-te da parte que é a família preocupada com as tuas preferências sexuais... E o desarranjo que é ter que explicar, dar satisfações, no fundo justificar que até gostas de homens, e de quase tudo neles, eles é que não andam aí...


    ah, e no fundo alguns desses pares têm inveja da liberdade que o singular traz.

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  16. Estou a ver que não sou só eu que este texto assenta perfeitamente...

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  17. E eu a pensar que no final do texto ias escrever "essa a amiga é a Rafaela ali do Odisseando"...lol!
    Parece que somos mais que as mães!
    E se fizéssemos um jantar de raparigas solteiras, giras e interessantes? ah ah

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  18. Eu não sei em que mundo vivem vocês. Dizer-se, no contexto em que vive a Luna, que actualmente uma solteira "escapa à compreenão dos demais, nem se encaixa na nossa percepção de normalidade social, onde o singular é encarado com desconfiança face ao conforto dos pares" é um perfeito disparate. Acho é que muitas solteiras adoram vestir essa pele. Porque é cool. Porque acham que são diferentes.

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  19. Das outras não sei, Rita, falo de mim. Mas infelizmente é assim. Desde há muito tempo. Tinha 17 anos a primeira vez que uma amiga com quem tinha combinado ir sair me telefonou para dizer: desculpa, mas é que vão só casais.
    Eventos familiares então, são de fugir. Perguntas e mais perguntas, como se o facto de nunca nos terem conhecido um namorado fosse uma coisa assim esquisita, uma doença ou assim. Principalmente quando se vai quase nos 30.

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  20. Nunca senti nada disso. E não estou a dizê-lo só para ser do contra. Sempre me irritou este discurso das solteiras que são marginalizadas e olhadas de lado. Se calhar tenho sorte. Ou se calhar, que acho muito mais provável, sempre reagiram ao meu estado civil, amigos e família, da mesma forma natural com que eu o vivo, sem me preocupar em teorizar sobre ele. Tenho 35 anos, encaixo no protótipo da solteira que descreveste, excepto nessa coisa da marginalização. Nunca me senti desconfortável entre casais, antes pelo contrário, mesmo sendo a única solteira, nem nunca questionaram o meu estado civil. Sei sim de casos em que solteiras optam por não aceitar esses convites porque acham que vai ser uma seca. Sinceramente, acho que isso está na cabeça de muitas solteiras, elas sim preconceituosas. Porque, como disse, gostam de vestir a pele de marginalizadas, porque é cool.

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  21. Rita, não é cool ser-te dito, como a mim: o melhor é não vires porque são só casais.

    Não digo que seja assim com toda a gente, mas de vez em quando é. E não o digo para ser cool, digo porque já o vivi.

    Aliás, este texto é muito pessoal, tive quase para não permitir comentários nele por isso, pelo que não pretende ser nenhuma manifestação de coolness, apenas uma análise a uma condição minha, à minha vida, e aos interrogatórios a que sou sujeita de cada vez que, por exemplo, mudo de país e meio.

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  22. Bom, então tens de facto muito azar.

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  23. E eu também sou essa amiga ;)

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  24. Não sei se é azar da Luna ou sorte da Rita. Sempre me senti mais marginalizada (e muito) por parte da família, nunca dos amigos. Na faculdade maior parte dos meus amigos eram casais e casais que estudavam juntos e eu nunca me senti estranha por isso. Hoje com namorado posso dizer que detesto sair aos casais. Parecem-me sempre saídas fechadas e enfadonhas, em que se acaba a falar das mesmas coisas. Levo um qualquer amigo/a para uma saída de casais desde que saiba de antemão que não se vai sentir incomodado. E na verdade essas "saídas" de casais parecem-me sempre uma parvoíce, se as pessoas são amigas, é suposto que se sintam sempre bem na companhia umas das outras, indepentemente do apêndice.

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  25. Mas tambem ha' versoes masculinas da "amiga". Sim, nao e' novidade nenhuma: o amigo que e' calminho, mas que ate' arrisca, que e' social, que nao e' giro nem feio nao deixando de ser engracado (com cedilha)... Tabem o ha' por ai'!

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  26. Sim, mas eu não sou o amigo.

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  27. E eu também sou essa amiga, embora adore a minha independência muitas vezes sinto a falta de alguém. C'est la vie.

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  28. Mas as pessoas deixam de ser "independentes" se tiverem um namorado (a)?

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  29. quando é que fazemos uma festa com todas estas solteironas "porreiras, inteligentes, divertidas, com piada, que gostam de sair e de festa, comunicativas e sociáveis, conhecidas pelo seu sentido de humor peculiar"?

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  30. e eu também:) Claro que no meu caso, faltam aí alguns defeitos que só acrescentam ao charme.
    Mas bom mesmo é ler um texto e a identificação ser total:)

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  31. E eu... afinal somos muitas! :)

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  32. Eu tb me encaixo no perfil da suposta mulher que tem tudo para ter sucesso mas afinal esse sucesso resume-se para os outros apenas em ter um namorado ou casar! O resto da nossa vida não conta para nada se estivermos sozinhas, parece que vivemos sem propósito ou sem finalidade mesmo que tenhamos uma vida preenchida de aventuras, projectos, hobbies, como se o objectivo da vida fosse unicamente casar... Então quando digo que fui de ferias sozinha recebo uns olhares de espanto e pena que metem dó... mas na verdade até nos hoteis e restaurantes me sinto discrimindada por ser single!

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  33. Adorei o texto! muito bem! Já há muito tempo que não via por aqui um texto tão bom ;)

    * beijocas

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  34. Tudo o que saia dos padroes da sociedade e visto com desconfiança.
    Respeitar a maneira de estar de cada um e tao facil.

    Admiro como te expressas atraves da escrita.

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  35. Hoje em dia cada vez é mais "normal" ser-se assim... quase nos 30. Aliás, é a idade para se estar assim! É aproveitar!
    Dentro de dias faço 41. E essa amiga também sou eu. Com uma diferença: fui sempre convidada, mesmo que o lugar em frente a mim fique vazio.

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  36. Eu diria que somos amigas pioneiras e o pioneirismo nunca é bem visto, principalmente quando parte de mulheres...

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  37. Já agora.. E eu! Lol
    Não pude deixar de comentar.
    : )
    Na verdade é mesmo isso, de olharem como se faltasse o braço ou a perna. Aquele fazer de conta que igual...
    Claro que antes uma boa companhia mas, não havendo melhor..tenho a minha.

    : )

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  38. Adorei o texto! nunca me senti verdadeiramente marginalizada, salvo um comentário ou dois absolutamente estupidos que ouvi vindo de pessoas parvas e grosseiras :) Acho até que quem estranha ou questiona ou mesmo crítica a solteirice a independência, o facto de se fazer o que nos dá na cabeça, acaba no fundo por admirar e critica porque n tem coragem para fazer o mesmo :)

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  39. Adorei o texto! nunca me senti verdadeiramente marginalizada, salvo um comentário ou dois absolutamente estupidos que ouvi vindo de pessoas parvas e grosseiras :) Acho até que quem estranha ou questiona ou mesmo crítica a solteirice a independência, o facto de se fazer o que nos dá na cabeça, acaba no fundo por admirar e critica porque n tem coragem para fazer o mesmo :)

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  40. Só li agora o post, mas n poderia ter sido em melhor altura. No sábado estive num casamento em que até o fotógrafo se lembrou perguntar 'mas não falta aí alguém?'...
    Obrg pelo texto! :)

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