26 de janeiro de 2012

Posso não comer bolo?

exemplo típico do bolo (este é igual ao de hoje)

Aqui no lab há a tradição de se trazer bolos quando se faz anos, se tem artigo publicado, ou em caso de qualquer outra celebração pessoal, durante o coffee break das 10h30 da manhã. Ao contrário dos nossos tradicionais bolos de aniversário, aqui consistem numa espécie de tartes, cheias de compota, que odeio, e geralmente com uma camada de aí um palmo de natas batidas com um sabor qualquer por cima.

Eu, apesar de ser o que se costuma chamar na gíria de "boa boca", gostando mesmo de comer, nunca fui de doces, sendo coisa que não me aquece nem arrefece, e passando perfeitamente sem os comer no meu dia a dia. Talvez por não ter sido criada com doces em casa, que eram mais para ocasiões especiais, posso passar semanas sem sentir vontade, ou necessidade, de comer um. E dado que não estou propriamente a ir para magra, e tendo em conta que não gosto especialmente, opto normalmente por passar a fatia de bolo, embora me junte nesses dias ao coffee break para dar os parabéns à pessoa, e beber o meu café tranquilamente em convívio. Mas não é fácil.

Acontece que, desde que aqui comecei a trabalhar há mais de três anos, de cada vez que educadamente declino a oferta, sou imediatamente bombardeada com quinhentos porquês, sendo obrigada a explicar over and over porque não quero comer bolo, repetindo pela quadragésima vez que não sou especial fã de doces, e que tendo dificuldade em abdicar de outras coisas, me parece sensato não emborcar com 2000 calorias goela abaixo, que ainda por cima não me dão grande prazer.

O problema é que os holandeses, apesar da fama de serem um povo extremamente tolerante, o são apenas desde que as pessoas não ajam de forma diferente da maioria, de outra forma questionando-nos até à exaustão - ainda me lembro da vez em que estava um bocado agoniada, e resolvi ir buscar uma coca-cola, que a mim geralmente faz bem, e bebê-la durante o coffee break, tendo de explicar umas dez vezes porque é que estava a beber coca-cola e não café como toda a gente.

Depois de na segunda-feira ter feito uma vez mais o discurso "I don't really like sweets, and I haven't been getting thinner lately, and since it's difficult for me to diet on everything else, I think I can skip the cake" para tornar a explicar que não quero comer o caralho do bolo, hoje, pacientemente, voltei a repeti-lo, tal como faço desde há 3 anos, pelo menos aí uma vez de duas em duas semanas. Até que fui questionada segunda vez, e a impaciência começou a tomar conta de mim, repetindo o discurso com enfado. Foi então que uma colega que não bebe me mandou a boca "you know, drinking also makes you fat, and beer has a lot of calories", numa de superioridade moral, porque se eu não bebesse não precisava de não comer bolo, do qual não gosto, e me fará ficar enjoada o dia inteiro, mas do qual segundo ela deveria gostar, e aproveitar para enfardar à grande, especialmente quando é grátis. E controlando-me para não responder bardamerda e que se metesse na sua chata e enfadonha vida de colecção de cupões de supermercado que pede a toda a gente, para ao fim de juntar quinze receber um desodorizante rexona grátis, resolvi acabar com a conversa de uma vez e por todas com "exactly, and I'd rather keep drinking beer than eat cake, do you mind?". Caraças, pá. Eu só quero não ter de comer o bolo descansada.

24 comentários:

  1. Marlucinha, também estás em Central European Time. Baralhaste-me. Julguei que já era hora de jantar.

    Luna, Skip the motherfucker cake!

    http://simaoescuta.blogspot.com

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  2. Os nossos bolos costumam ser às 5h, porque às 10h30 o trabalho ainda mal começou... Mas felizmente não são desses cheios de cremes esquisitos (à moda europeia). Costumam ser bem bons (à moda portuguesa, não estivessemos nós no Porto)! :)

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  3. ora aí está uma coisa que me faz ficar completamente fora de mim. Acho que até costumo ser paciente, mas se tivesse que ouvir esse questionário tantas vezes como tu acho que já tinha dado uma resposta torta.

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  4. Uma coisa que eu aprendi a dizer com os Holandeses, mesmo passando por mal educada, é dizer "só" que não. Queres bolo? Não. Queres vir almoçar? No thanks.
    Assim evito as perguntas seguintes e esse tipo de ataques palermas de gente q nunca sabe o que dizer. Asseguro-te que foi uma benção. bjs!

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  5. ahah!! E pumba, calas-te-a logo, relamente, gabo-te a paciência!!

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  6. Podes sempre alegar que na tua última visita ao médico ele detectou níveis assustadores de hiperglicémia e que te aconselhou a que se só de olhares ou provares, ou tocares com um dedo um bolo nos próximos dez anos arriscas sofrer de diabetes tipo II. Pelo menos eu quando não gosto de uma comida e já sei que lá vem insistência das duas uma ou alego que sou alérgico e se como um bocadinho que seja entro em imediato choque anafilático ou dou a desculpa das análises e da diabetes. Dá sempre certo e nunca mais me chateiam, particularmente com os meus sogros transmontanos...

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  7. Pois, ainda se fosse a primeira vez, mas nao, há 3 anos que repito sempre a mesma coisa (somos cerca de 20 no grupo, ou seja, 20 vezes ao ano, fora ocasioes especiais, vezes 3 anos, pelo menos 60 vezes).
    Adicionei imagem do bolo típico. São quase sempre assim. E eu nao consigo mesmo comer aquela quantidade de chantilly sem ficar enjoada o resto do dia.

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  8. Ui, eu comeria uma fatia disso agora...

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  9. Andorinha: acho que essa regra só se aplica entre holandeses, ou entao lido com uma amostra especialmente cusca. nao há nada que eu faça fora da norma que nao seja questionada por alguém.

    (até deixei de mandar encomendas para o trabalho, porque nao havia coisa que recebesse que a secretária nao me perguntasse o que era. continua a perguntar quando recebo coisas que o meu pai me manda em correio registado (tipo documentos, cartoes bancários das contas portuguesas e assim, que tendo de ser registados, é mais fácil mandar para o trabalho, onde estou durante os dias uteis). o resto passei a preferir ter de ir buscar aos correios, do que ter de responder a um questionario de cada vez que recebo uma encomenda pessoal)

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  10. n respondas.. nada como um "sorriso" amarelo e em silêncio. ou então diz, tal como a andorinha recomendou só "não" ou "sim".

    Uma coisa que as pessoas não se apercebem mas é de que isto é de certo modo uma "guerra" pela ocupação do nosso espaço. E nós "legitimamos" o invasor ao aceder a responder-lhe ao que quer q seja. Não tens de te justificar a ninguém, muito menos à secretária ou o que quer q seja. Ela que faça as perguntas, não recebe resposta. ou então um "sim", "nao", "o tempo hj está bonito..."

    A não-simpatia funciona muito bem. e é uma benção..

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  11. Em cada holandês habita uma sogra, é? :D

    Não obstante eu achar que és um bocadinho herética (só falta dizer que não gostas de chocolate), tens tooooodo o direito de recusar. Mas sabes? Há pessoas que têm trabalhos onde nunca são oferecidos bolos. Pensa nessas pessoas :(

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  12. Izzienha, gosto muito de chicolate, especialmente se for do bom - belga ou suiço -, mas apesar de me pelar por uns Lindor da Lindt, ou umas boas trufas da Godiva ou neuhaus, a verdade é que como uma (ou duas, vá) e pronto, fico mais que satisfeita.

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  13. A tua colega é uma parvalhona, mesmo!
    Daquelas que merecia uma resposta não tão bem educada como a que tu conseguiste dar, mais pontos para ti!

    Essas tartes tipo multi vlaai são realmente um enjoo! Muito más!

    Em relação a bebidas, há Periquita no Ah, ao preço de Portugal. Se calhar já sabias =)

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  14. Nao, nao sabia. Great news!
    Obrigada pela info :)

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  15. p.s. alguém que me compreende e sabe quão más são aquelas tartes.

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  16. Acho que encontrei a companhia ideal para partilhar uma caixa de chocolates.

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  17. Bolas, são mesmo chatos! Estás realmente rodeada por muita gente cusca! E sim, isso tem um aspecto mesmo enjoativo, estou solidária.

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  18. Bem, agora de repente regressei ao passado, ao meu escritório em Hoofddorp! Toda a santa semana lá vinha o bolo, todos a saber ao mesmo, uns com creme de moka, outros com creme e fruta por cima, com uma espécie de geleia brilhante. Eh eh eh que grande flashback.
    Mas no meu escritório, sendo ambiente internacional, o não comer era perfeitamente aceite e não questionado.
    Esta semana tive outro flashback gastronómico holandês, a recordar o famoso Febo com um colega daí. O grande Febo, esse templo do fast food, onde retiras hamburguers e kaassufle e frinkandel de umas portinholas tipo cacifos, que abrem metendo uma moeda. Mítico.

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  19. Este comentário foi removido pelo autor.

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  20. Como te compreendo... Tmb gosto muito de comer, mas bolos foi coisa que pela qual NUNCA salivei. Até gostava de ver a reacção dos meus cleguinhas se desatasse a distribuir pratinhos de tripas no dia do meu aniversário "Então? Não comes? Não gostas? A sério?"

    Boa resposta essa ;) 10 pontos para a Luna.

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  21. Querida Luna,
    gosto muito do teu sentido de humor! e do blogue! parabéns pelo merecido prémio!
    Se quiseres partilhar uma caixinha de neuhaus estás à vontade, tu comes 2 e eu como as outras todas!
    Eu descobri que a melhor maneira para se deixar de comer alguma coisa que nos agonia, é dizer que somos alérgicos. A agonia é uma espécie de alergia, não é?!
    boa semana,
    cata
    http://longoriotranquilo.blogspot.com/

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  22. Já passei várias vezes por situações iguais a esta (ou era só uma que se repetiu durante todos os dias de uma semana). Só não era com bolo e cerveja.
    Ainda estou para perceber por que é que há gentinha que acha que tem algo a dizer sobre a vida dos outros.

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  23. Eu tenho esse problema em Portugal com bebidas alcoólicas. Não gosto, ponto. Mas as pessoas não entendem: "bebe só hoje", ou "uma vez não faz mal". Mas qual fazer mal?! Eu não gosto.
    Já com bolos não é preciso insistir, eu como com apetite, eheheh!

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