23 de janeiro de 2016

Uma-em-três ou uma-em-quatro


do excelente post da DS sobre a prevalência da violência contra as mulheres no mundo

7 comentários:

  1. A diferença de números não é espelhada nas estatísticas porque os critérios europeus para definir violência - e também a sua denúncia - é completamente diferente dos critérios usados no oriente. Aliás, mesmo entre nós, há uma falsa ideia de aumento da violência que se prende, afinal, com a alteração do conceito de violência.

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    1. Não acredito que haja aumento de violência, concordo que há de facto mais noção do que é violência e mais denúncias.

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  2. Não me parece que a diferença de critérios para definir a violência seja uma dimensão relevante que vá deturpar as percentagens neste estudo. A chegada a estes números foi feita através de uma revisão da literatura de estudos publicados em jornais científicos que por sua vez reuniram dados sobre violência através de inquéritos junto de amostras representativas. Ou seja, não entraram nesta contagem estatísticas de queixas à polícias ou outros números oficiais que pudessem eles estar enviesados por diferentes conceções oficiais de violência. Mesmo a metodologia mais consensual de colocar as perguntas aos inquiridos para obter os resultados mais fiáveis é a de descrever os atos (por exemplo: "Já foi vítima de pontapés, murros, chapadas, queimaduras...?") do que simplesmente perguntar se já foi vítima de violência por um parceiro no geral. Depois de ter ido ler a metodologia do estudo fiquei convencida que os dados podem estar muito mais certeiros do que inicialmente suspeitei.

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    1. Não estou bem a ver em que circunstâncias foram feitos inquéritos a mulheres muçulmanas que vivem trancadas em casa... Conheço muito bem a falibilidade dos dados recolhidos em Portugal e por estes posso imaginar o que se passa com os números dos países muçulmanos.

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    2. Bom, foi feita uma seleção durante a tal revisão da literatura e os estudos que tinham metodologia duvidosa ou pouco rigorosa não entraram para a contagem, portanto deduzo que os que entraram eram minimamente fidedignos. Dito isto, quando em 2014 a FRA fez o tal inquérito direto a 42 mil mulheres europeias concluiu que afinal as mulheres que tinham sido vítimas de violência física e sexual era de 33% (contra os 25% que a OMS achou), portanto se houver mais ou menos o mesmo nível de subestimação para as mulheres muçulmanas a diferença seria entre 33% - 45%. É a diferença entre um terço ou metade ter sofrido violência. Confesso que ainda assim esperava uma diferença mais abismal.

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  3. Não obstante a ideia estereotipada que temos relativamente ao quotidiano das mulheres que vivem em países islâmicos, a verdade é que estes países não são um grupo homogéneo e entre eles coexistem diferentes graus de liberdade (formal e nas práticas quotidianas). Não é verdade que as mulheres estejam sempre fechadas em casa. Muitas mulheres têm profissões, existem universidade e existem movimentos feministas. Tal como na Europa a igualdade de género e a violência contra as mulheres não é igual em todos os países, no Médio Oriente e no Norte de África também existem muitas diferenças. Basta pensar na Fatema Mernissi, recentemente falecida, que era uma investigadora e docente universitária marroquina e feminista. Não era a única. Observe-se também a maior ou menor “islamização” da indumentária das primeiras damas dos países islâmicos para se ter logo uma ideia das diferenças do estatuto das mulheres nos diferentes países. Claro que também há as próprias assimetrias internas (tal como em qualquer outro país). Nós, no ocidente, temos uma visão muito estereotipada e muito influenciada pelas imagens passadas pelos media. Mesmo nos países onde as mulheres têm muitas restrições no acesso ao espaço público é possível aplicar inquéritos - através da internet ou bastando que a pessoa que aplique o inquérito seja uma mulher. Não sei se recordam de uma rapariga que contava o seu quotidiano no Iraque ocupado num blogue (Bagdad burning). Recomendo muito a leitura do livro: Nove partes de desejo: o mundo escondido das mulheres islâmicas, da Geraldine Brooks, uma jornalista que durante anos fez a cobertura noticiosa do Medio Oriente. Apesar de já ter algumas coisas desatualizadas (tanta coisa se passou entretanto), ela descreve muito bem algumas das metamorfoses (algumas pró-conservadoras) em alguns países e explica a origem de muitos dos interditos. Por exemplo, o profeta só se lembrou de começar a ouvir “mandamentos” particularmente opressores para as mulheres, após a morte da primeira mulher dele, que era comerciante e que o sustentava…. Recomendo também muito o filme Caramel, que retrata a história de quatro mulheres no Líbano. É um filme belíssimo e que também retrata algumas situações em que coexistem valores contemporâneos com imposições e pressões de costumes conservadores (p.e. uma das personagens submete-se a uma himenoplastia para corresponder às expetativas do noivo e da família e vemos como é fácil aceder a uma operação desse tipo. Em contrapartida, uma das personagens só consegue alugar um quarto numa pensão ranhosa, por não ser legal uma mulher alugar um quarto de hotel sozinha ou acompanhada de um homem que não seja seu parente ou marido). As personagens todas trabalham (num cabeleireiro) e deslocam-se no espaço público sem grandes constrangimentos e, inclusivamente, algumas conduzem, têm carro, outra está divorciada, etc. O filme tem uma fotografia belíssima, excelentes interpretações e uma banda sonora magnífica. Foi realizado por Nadine Labaki, uma mulher libanesa, que também interpreta a personagem principal.

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    1. Eu confesso que enquanto pensava sobre a questão e escrevia o post estive bem ciente do meu fraco conhecimento da situação das mulheres no Médio Oriente e de como o pouco que sabia era graças à mensagem simplista e redutora que me chega através dos media ocidentais. Por isso todas as sugestões sobre por onde começar a aprender sobre a região e onde possa entender melhor as nuances da situação das mulheres nessa parte do mundo são benvindas, obrigada.

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