Habituamo-nos a tudo. Habituamo-nos à doença, aos tratamentos, à perda de cabelo. Habituamo-nos à lenta perda de capacidades, à perda de peso. Habituamo-nos à fragilidade e ao cansaço constante. Habituamo-nos à incapacidade de pequenos esforços, à vida de reclusão, à dependência. Habituamo-nos porque gostamos e no fim nem nos parece assim tão mal. Habituamo-nos às frases feitas de alento, às explicações falsas ao telefone “melhorzinho… devagarinho”. Aos sorrisos forçados, para não deixar escapar o desânimo. Habituamo-nos a tudo o que não nos deixe ver a morte anunciada. Por mais um tempo, mais um adiamento. Habituamo-nos a enganar-nos uns aos outros para evitar a tristeza e fugir do que sabemos inevitável.
Será que nos habituamos também à ausência?
Será que nos habituamos também à ausência?