Acabavam por me vir cumprimentar quando alguém me apontava, depois de passarem por mim vezes sem conta sem me verem, representando a dor em forma de lágrimas. Davam-me beijos, comentavam o quanto éramos parecidas, e diziam-se “muito amigas”. Eu pensava como era estranho não conhecer as “muito amigas” e como as “muito amigas” não me conheciam a mim, a filha com 25 anos. Outras diziam ter-me conhecido em pequena. E eu questionava-me porque é que pessoas “muito amigas” não a viam há 20 ou 30 anos. Abraçavam-me, choravam, não sei se pretendiam que chorasse nos seus ombros e me consolasse também no seu remorso. Mas como, se não havia qualquer ligação? E acabava eu a consolar desconhecidas que se diziam “muito amigas” de uma infância longínqua. Continuo sem perceber como é que pessoas “muito amigas” não tiveram tempo para telefonar ou aparecer durante os 4 anos em que esteve doente. Não percebo porque tanto choravam por alguém que já não conheciam. Por vezes pensei que se não fosse eu filha, e soubesse ser o meu pai o marido, confundiria os laços familiares no meio de tanto teatro e manifestações de pesar. Mas talvez fosse a sua forma de redenção. Em mim, restou a indiferença e o desprezo à tal amizade.