19 de dezembro de 2006

Já cá faltava

Com o referendo sobre o aborto à porta já começam a chegar e-mails moralistas com mensagens pró-vida como se fosse isso que se estivesse a discutir. Entre power-points repletos de borboletas e cascatas e pores do sol e mensagens de a vida é bela, recebi um especialmente bonito. Não resisto a partilhar:

O que recomendarias ou pensas que se deve fazer perante os seguintes cinco casos de gravidez?
  1. O pai é asmático, a mãe está tuberculosa. Têm quatro filhos. O primeiro é cego, o segundo é surdo, o terceiro morreu e o quarto tem tuberculose. A mãe está grávida de novo. (Eu até já sei que vou matar o Beethoven, se bem que me parece já ter visto esta versão com sífilis à mistura e com ainda mais deficientes)
  2. Um homem branco viola uma menina negra de 13 anos e esta ficou grávida. Se fosses o pai desta jovem. (Maravilhoso, acho lindo uma jovem ser violada com 13 anos e ter o filho fruto da violação porque a criança não tem culpa e mesmo que a mãe tenha uma merda de uma vida depois não faz mal porque será recompensada lá no céu e todos somos filhos de Deus e só é mesmo pena é que eu não acredite em Deus)
  3. Uma senhora está grávida; já tem muitos filhos, dois deles morreram, o seu esposo está na guerra e a ela resta-lhe pouco tempo de vida. (Outra situação maravilhosa, acho que sim, que devia ter o filho e de preferência mais ainda para que possam todos ficar órfãos e felizes ao cuidado da sociedade)
  4. Um pastor e a sua esposa enfrentam problemas económicos muito fortes, já têm 14 filhos, são realmente pobres. Considerando a sua extrema indigência. (Opá, onde comem 14 comem 15, porra!)
  5. Uma jovem está grávida; não está casada e o seu noivo não é o pai do bebé que está esperando. (Não sou moralista, ela que fizesse o que quisesse, na altura também não haviam testes de paternidade)

Conclusões:

Se respondeste que (SIM) em alguma das situações anteriores, lê o seguinte:

  1. Terias morto: Beethoven.
  2. Terias assasinado uma das cantoras negras mais famosas: Ethel Walters.
  3. Te teria tocado assassinar um ser muito humano, a um pastor de almas: João Paulo II.
  4. Terias aniquilado a um dos mais grandes pregadores do século passado: John Wesley
  5. Terias assassinado: Jesus Cristo.

E neste momento penso que não há limites para a estupidez humana. Só porque algumas figuras notáveis foram fruto de situações de extrema pobreza e desgraça, as virtudes de uns não podem servir como argumento aos defensores do Não, da mesma forma que não faz sentido a pergunta Abortarias Adolf Hitler?. Até porque não só a vida do bebé conta, mas a da mãe. E nestes arautos de sabedoria bacoca o destino destas nunca é referido. Suponho que tenham tido vidas risonhas e felizes...

16 comentários:

  1. Na esquina da minha rua diz: "Pagar os meus impostos para financiar clínicas de aborto? Não, obrigada."
    (Acho particular interesse ao obrigada: este é um assunto só de mulheres e os homens que se f*dam.)

    Fora isso, 'tou-me a defecar para o assunto; eu tenho a minha opinião e mantenho-a sossegadinha e inabalável. Se eu não chateio nem crio cartazes, porque chateiam vocês? Eles...

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  2. Os defensores do "não" querem ver a questão discutida desta maneira.
    Matarias...?
    Ou seja, os defensores do "sim", são assassinos e os do "não" são os últimos defensores da vida. Não interessa se até são a favor da pena de morte, e muitos deles até são...
    Não se pode discutir a questão desta maneira. O feto na barriga da mãe é responsabilidade social quando tem dez semanas ou diz apenas respeito à mãe e ao pai? Isto é que se devia estar a discutir. Em termos de "a nossa cidadania". O que queremos fazer dos nossos filhos e das nossas vidas. Mas acho que seria um assunto demasiado sério para a nossa sociedade bacoca. Uma questão demasiado profunda para as nossas cabeças ocas, cheias de açúcar e morangos e colesterol e entupidas de informação mal parida e inconsequente.
    Há muito para fazer e dizer sobre isto, mas quando o debate se resume a estas questões estúpidas, o que fazer...?

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  3. Bolas..., estou cansada, farta e a rebentar pelas costuras com este assunto.
    C'um raios... não há 'verdades' absolutas!
    Não há c* que aguente!!!

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  4. Como diz e muito bem o pedro, as opiniões são de cada um, e não é o mailzinho idiota ou uma "pérola" da arte pública urbana que vai fazer alguma diferença. se as pessoas realmente se preocupassem em discutir o assunto em vez de mandar atoardas... mas isto parece-me tudo natural. Pegamos no post das "maneiras", juntamos este assunto, os boys e os futeboys, um pouco de floribella, 2 morangos e um pacote de açúcar e temos uma boa amostra da mentalidade colectiva. Quanto á minha opinião, nem vale a pena dá-la. É tão incoerente que nem a poderia por a discussão. mas isso sou eu.
    Desculpai a extensão ;)

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  5. sim... ok! teriamos morto essa gente, no campo das hipóteses... como se não estivessemos como sociedade que somos já a estrangular centenas de génios perdidos (miudos talentosos) em bairros de lata! em vez de fazerem inquéritos palermas que tal tentarem melhorar efectivamente as condições de vida dos vizinhos de cidade, de rua, etc... talvez assim contribuissem verdadeiramente para deixar de existir aborto, porque aí muita gente teria escolha!!! e não estariam sujeitos a uma vida de miséria! ora, haja paciência!


    P.S. impressão minha ou não se sabe mesmo no que se vai votar.... o aborto em caso de violação ou de gravidez de menores não é já permitido por lei???

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  6. Gosto muito do post anterior. Bonita forma de falar da dor da ausência. Escreve... até que a voz te doa.

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  7. Fechem os cemitérios! Impeçam os doentes de falecer! Não às agências funerárias! "Nós" somos pró-vida!

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  8. É sempre um assunto que nos toca.

    E, o que se pode de dizer de novo???

    Não faço a mínima ideia!!!

    Mas, para mim, só vida não vale. Tem de existir, qualidade de vida.

    Há certos senhores, deste movimentos "hipócritas" que têm dinhieor suficiente, para levarem as filhas, as mulheres, as sobrinhas e sei lá eu quem mais... a clínica na nossa vizinha Espanha. E, que andam a proclamar a vida a vida aos 7 ventos, sem saberem, o que é uma pessoa não ter dinheiro para a comida, pra os remédios, para educação....


    Essas pessoas, pensam, quem faz um aborto , tem um gesto de egoísmo, mas para mim, quem toma essa decisão, que nunca é fáciel de tomar, tem uma consciência que não lhe permite ver o sofrimento de outro ser humano ou o seu próprio sofrimento.

    São assuntos, que não deveriam chegar aos dias de hoje, empleno século XXI, sem resolução...


    É ridiculo e cansativo estar a falar sempre do mesmo...

    Avancem para o futuro e resolvam o assunto de vez.

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  9. Este é capaz de ser dos mails mais idiotas que já recebi respeitante ao assunto em questão. Sobretudo porque o argumento é perfeitamente reversível. Vêm logo à cabeça n nomes que justificariam a prática de aborto :)
    Mas mesmo boa é aquela apresentação em powerpoint em que a criancinha vai gritanto porque está a ser desmembrada... :)

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  10. Luna, da minha parte, esquece o que disse sobre o Pedro no meu comentário anterior :s....

    Pedro, no esquina da rua, o que diz exactamente é isto: http://esquinadarua.blogspot.com/2006/11/nim.html

    Se mensagens como a que a Luna postou me dão vontade de dizer "sim"; pessoas que deturpam, truncam, contorcem ideias alheias a seu bel-prazer, ou daquelas que são as suas próprias, dão-me vontade de ir pelo "não".

    De qq das formas, e dado que o nome que indicas é "esquina da minha rua", aspando o que, de todo, não está escrito no "esquina da rua", nem nos comentários, ainda ponho a hipótese que estejas a referir-te a qualquer outro local (que nem vou procurar).

    Mas, partindo do princípio que estamos a falar do mesmo blog, o mais interessante é que nem tenho gente capaz de me mandar mails do tipo deste, simplesmente porque o meio em que me movimento é pelo sim ao aborto, meu caro.
    Contudo, isso não me retira a capacidade de submeter a dúvida à minha própria apreciação, porque não sou um cãozinho daqueles que, por efeito de mola, concordam com tudo o que os faz agitar.

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  11. Penso que criei um mal-entendido.
    O que eu queria dizer era:
    Na junção da Avenida de França com a Rotunda da Boavista, está um cartaz que diz "Pagar os meus impostos para financiar clínicas de aborto? Não, obrigada."

    Preferia tê-lo lido num blog do que num gigante outdoor...

    (O que eu defendo(?) é que cada um(a) faça o que quiser. Assim como eu faço o que quero.)

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  12. lol

    Pedro, desculpa..... não li o "da".

    É que aquela minha entrada, num dia, originou mais visitas ao blog do que deve ter durante um ano!

    Mea culpa! Imaginei coisas.... será caso para psiquiatra? mania da perseguição e tal?! :\

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  13. Vivam. Permitam que me junte à vossa discussão para dizer o seguinte:
    Parece-me que o que está em causa neste referendo e em tantos quantos voltem a fazer caso neste o sim volte a fracassar, não é a escolha entre a vida e a morte como quem defende o não nos quer convencer. O que está em causa é se as mulheres vão abortar em condições insalubres e ilegais, colocando em risco, aí sim, a sua própria vida, ou, para quem pode, vão fazê-lo a países onde é legal, ou se, por outro lado vão passar a poder abortar em clínicas nacionais com a higiene e o profissionalismo que qualquer intervenção "cirúrgica" exige.

    Creio que não deve haver mais hipocrisia sobre este assunto porque hoje em dia quem quer mesmo abortar, aborta!
    Cumprimentos a todos.

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  14. Olá, olá. Encontrei seu blog ao procurar algo no Google. Sou contra o aborto por um princípio simples: todos têm direito à vida. No momento em que alguém legisla sobre quem deve nascer ou morrer, por que não legislar sobre quem deve continuar vivo ou morrer? No último caso, temos o nazismo e outros regimes ditatoriais que definia quem merecia morrer ou continuar vivo.
    Por favor, seja educada com este estrangeiro (brasileiro) e não me dê uma resposta mal-criada...
    Um abraço, daqui do lado de baixo do Equador,
    Olavo

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  15. Caro Olavo

    realmente o seu argumento é bastante simples, diria mesmo que não o podia ser mais, mas ainda assim dou-me ao trabalho de responder.

    - em primeiro lugar você tem a seu favor o facto de não poder engravidar, mesmo que ande por aí a fornicar - eu ia dizer foder, mas depois lembrei-me de não ser mal-educada - que nem um maluco, à grande e à francesa e sem qualquer protecção, pelo que, caso aconteça um acidente, não terá que ser você a ter na barriga uma criança durante 9 meses e a ter que criá-la, embora legalmente já se obriguem os pais a dar uma ajuda monetária, o que ainda assim não é de todo a mesma coisa. Assim é fácil defender a vida e o direito a ela, uma vez que a sua nunca será alterada significativamente por uma gravidez profundamente indesejada. Mas ainda bem que é contra o aborto, porque assim, se por acaso um dia mandar uma queca numa noite de folia e nem se lembre da cara da mulher no dia seguinte, se por acidente ela engravidar terá um filho com ela e criá-lo-á como deve de ser e como se fosse muito desejado.

    - em segundo lugar, o que se decide na despenalização ou não da interrupção voluntária da gravidez não é quem deve viver e quem deve morrer - as pessoas que são contra o aborto continuarão a não recorrer a essa opção - mas sim se uma mulher que faz um aborto deve ser considerada uma criminosa e ir para a cadeia.

    - em terceiro lugar uma mulher que não queira ter um filho recorrerá ao aborto quer seja legal ou não, mesmo pondo em risco a sua vida (é segunda causa de morte materna), o que pode ser visto pela quantidade de abortos clandestinos executados no país (dos quais um terço necessitam de recorrer a cuidados médicos hospitalares posteriormente), pelo que se conclui que a actual lei não evita esta prática generalizada mas apenas obriga as mulheres a fazê-lo sem quaisquer condições médicas, de higiene e de dignidade.

    - em quarto lugar, a actual lei apenas prejudica as mulheres de classe baixa, que não têm dinheiro para ir ali num saltinho a espanha fazer um aborto numa clínica de luxo sem quaisquer problemas como as ricas. as pobres têm que ir para caves infectas onde lhes perfuram os úteros com agulhas e coisas do género e de onde saem muitas vezes a esvair-se em sangue.

    - em quinto lugar não considero um embrião uma pessoa, mas um projecto de pessoa, que ainda não tem consciencia de si próprio, que ainda não é autónomo mas uma parte do corpo da mãe.

    - em sexto lugar, se a sociedade se preocupasse tanto com os milheres de crianças carentes e que todos os anos morrem à fome como tem vindo a demonstrar amor pelos embriões, este mundo estaria bem melhor. Mas parece que a preocupação acaba assim que saem cá para fora.

    - por último, e doa a quem doer, é uma opção da mulher ter ou não um filho e ninguém tem direito a obrigar uma mulher a ter um filho que não deseja, até porque eu acho que todas as crianças devem ser profundamente queridas e desejadas para que possam ser criadas dignamente e com amor.

    Cumprimentos

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  16. Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

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