23 de janeiro de 2010

Isto é tão bom

Em que outro jornal, para já não falar em blogs, poderíamos encontrar a comovente história do Pedro Jorge, de 39 anos, que vivia com o tio? O Pedro Jorge, símbolo de um Portugal que teima em ser Portugal, matou o tio com um tiro de caçadeira. E matou-o, não porque o tio lhe tivesse chamado filho da puta num blog, não porque o tio não o tivesse convidado para o lançamento de um livro, não porque o tio não lhe quisesse dar dinheiro para o vinho. Peço desculpa. Pedro Jorge matou o tio porque este não lhe quis dar dinheiro para o vinho, mas este facto revela apenas uma parte, e não a menos sanguinária, do carácter do rapaz-homem. É que, uma semana após a trágica ocorrência, Pedro Jorge, numa manifestação nobre dos seus sentimentos mais profundos, reconheceu que matou o tio, mas que já tinha saudades dele. Caro leitor, na selva urbana que é a nossa, as pessoas matam-se e poucas horas depois já nem se lembram do nome da vítima, se é que alguma vez a conheceram. Ao ler O Crime, eu desfolho um país, tacteio as inocentes pétalas deste bom povo e encontro gente genuína como o Pedro Jorge, gente que mata a família (a família, reparem, ele não matou um estranho, matou um familiar, também isto é ser português) quando esta não lhe dá dinheiro para o vinho (o vinho, meus amigos, o vinho; não foi cerveja, nem vodka do Lidl, foi vinho, e também isto é ser português), gente que arranja sempre um quartinho vago no coração para esse sentimento tão nosso e tão universal: a saudade. Também isto é ser português.


no Circo da Lama, outro dos meus blogues favoritos (sim, tenho muitos, eu sei, sou uma vira casacas)

(a parte de deixar de ser enfadonha e pseudo-intelectual segue dentro de momentos, mas este era demasiado bom para deixar passar em branco)

1 comentário:

  1. E é com tristeza que descubro que esse jovem é da minha terra. Felizmente não conheço, mas, pela honra do povo, sinto-me na obrigação de vir aqui assegurar que não somos todos iguais!

    Um beijinho*

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