23 de outubro de 2012

Ah mas a cultura e a tradição e o caraças

A cultura e tradição não devem ser razão para justificar comportamentos que violam os direitos e liberdades individuais. E não me venham com a história da opção, porque ela não existe de facto. E porque conhecem uma amiga duma tia duma prima que é excepção, e cuja voluntariedade é realmente consciente, ela não será regra. 
Se a maioria destas mulheres usa o véu/niqab voluntariamente? Certamente que sim. Tal qual como antes de Rosa Parks os negros americanos aceitavam voluntariamente não se sentar na parte da frente dos autocarros ou darem lugar aos brancos, ou muito antes irem voluntariamente para os campos apanhar algodão e fazer trabalho não remunerado. 
E desengane-se quem pense que são coisas diferentes, não são: trata-se de negar sistematicamente direitos e liberdades a seres humanos de uma faixa da sociedade. E não, não passa a ser mais aceitável porque esses seres humanos já aceitaram, se conformaram, ou deixaram de protestar, ou mesmo se acreditam não merecer esses direitos e liberdades.

27 comentários:

  1. A justificação da tradição é linda.
    Acho que voluntariamente não é o termo correcto. Conformadamente fica melhor.

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  2. Uma tradição também muito bonita é aquela da remoção de parte dos genitais femininos. Os outros, não sei, mas eu cá também acho que não se pode confiar numa mulher com clitóris.

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  3. Izzie, exacto, toda a gente sabe que uma mulher com clitóris é automaticamente uma vadia.

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  4. Apenas o lenço não me choca de todo, prefiro achar que eles sentem-se melhor tapando a cabeça da mesma forma que eu prefiro sair de casa de calças e acho meio estranho aquelas míudas que parece que se esqueceram delas em casa e saem do de leggings... Mas sim, não tenho dúvidas que essa tradição, penso que é originalmente uma tradição, é usada por muitos sectores das sociedades muçulmanas para restringir e anular ainda mais os direitos das mulheres. E isso é que tem de ser combatido, não o lenço.

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  5. A Declaração Universal dos Direitos Humanos serve exatamente para isso. Para ajudar a distinguir onde é que acaba a cultura (que merece ser respeitada com as suas caracterísicas próprias) e começa a ética e a dignidade humana.

    Um turco arrotar de forma audível no final da refeição é aceitável.É a sua cultura.

    Uma mulher ser condenada à morte por conduzir um carro não é nem pode ser aceitável.

    Quem não consegue discernir as diferenças deve ser respeitado. Afinal a burrice e a teimosia devem ser toleradas pois não violam os direitos humanos.

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  6. A mudança, se é para existir e para haver liberdade de opção, deve começar no espírito das próprias mulheres. Como estas:

    http://jessi-aleal.blogspot.pt/2012/10/mulheres-de-armas.html

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  7. Imperatriz Sissi

    eu acredito piamente que a mudança no mundo islâmico terá que começar pelas mulheres, e pela sua união. É que podem apedrejar, chicotear, prender umas quantas "dissidentes", mas não o poderao fazer a todas, se as rebeldes se tornarem uma percentagem significante, como acontece nas revoluções sociais.

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  8. Trazes este tópico a debate muitas vezes.
    Nao há liberdade individual nestas condicoes... true story. Eu sei de excepcoes (usam porque querem), mas sei ainda melhor que a maioria das muculmanas que conheco, está mais feliz por,longe do país de origem, poder realmente optar por NAO se tapar nem ser relegada para último na hierarquia social.

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  9. Pusinko
    Sim, mas não as suficientes, ou pelo menos não tantas vezes quantas as notícias de abusos e violência contra as mulheres aparecem. É um assunto que mexe especialmente comigo.

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  10. Agora é que a Luna disse tudo! Não as podem manietar a todas. Se elas não se moverem pela liberdade de opção - e outros direitos - o mundo ocidental, por mais que se indigne, estará sempre a meter o nariz onde não é chamado...e todos sabemos as limitações que existem. Sim, tudo depende delas. Com ajuda de alguns homens de carácter como o marido da Princesa Ameerah. Um saudita que está a mudar o seu país e a equilibrar tradição com justiça. Sem querer abusar, deixo aqui um post sobre este casal admirável, para quem não conhece...

    http://jessi-aleal.blogspot.pt/2012/08/a-princesa-ameerah.html

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  11. E ao mesmo tempo, o mulherio bate palminhas aos posts mais misóginos da blogosfera, ai porque são tão engraçados e irónicos.

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  12. O relativismo cultural não pode justificar a negação de direitos humanos básicos. Até porque o que para nós é relativo, para outros a quem a informação e educação é negada à partida, é absoluto. Sendo absoluta também a perda de direitos básicos.
    O exemplo de Rosa Parks é uma pedrada no charco.

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  13. CNS

    ainda há tempos, quando comentei que me chocou incrivelmente ver uma miuda de aí 5 anos toda enfaixada - não fosse aquela criatura perversa provocar os homens com o seu corpinho infantil - recebi imensos comentários a justificar que provavelmente a miuda até quereria usar aquilo por ver as mulheres da família, etc. Da mesma forma que certamente gerações de negros aceitaram ser escravos, ou serem discriminados, porque sempre foi assim e cresceram numa comunidade que o aceitava como norma, tornando-se normal aceitar e agir em conformidade. O que não o torna mais legítimo.

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  14. É preciso lembrar que mesmo essa "vontade" de usar o lenço, esse "porque querem e se sentem melhor assim" é uma construção cultural e social. Não é uma verdadeira liberdade nem uma verdadeira escolha, mesmo que pareça haver na cabeça de quem o usa. E o que tem de mudar é isso, essa construção de que uma mulher sem lenço é indigna, porque só assim isso deixa de ser parte dessa cultura.

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  15. Mariana: isso mesmo. sem tirar nem pôr.

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  16. A forma como as mulheres são tratadas, principalmente no Islão, dá-me arrepios. Saber que esse mundo está em todos os países ainda me arrepia mais (a MGF é feita em algumas comunidades aqui em Portugal, por exemplo).
    O uso da burka é, talvez, a parte mais suave desse mundo por isso é que há pessoas que o aceitam como normal, como cultural, muita gente prefere não perceber (ou não percebe mesmo) que essa é apenas a ponta do iceberg.
    Mas ao contrário de ti não acho que as coisas mudem se as mulheres lutarem simplesmente... porque acho que durante muito tempo, demasiado tempo, eles as vão matar mesmo todas.
    Atenção que admiro imenso as mulheres que todos os dias lutam esta luta um pouco inglória.
    Acho que a mentalidade só vai mudar com a educação das novas gerações e aí o papel das mulheres enquanto educadoras é que é fundamental.
    Infelizmente o que se vê é que na maioria dos países islâmicos a educação está ser cada vez mais radical.

    A mim entristece-me imenso que os países ocidentais ignorem sistematicamente estes problemas e apenas em casos pontuais haja alguma revolta.

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  17. Luna

    Concordo em absoluto. Os direitos humanos são pilares de uma humanidade à qual à partida se pressupõe que é dada as mesmas igualdades. Não se podem justificar regras repressivas à luz de uma qualquer cultura. A evolução é isso mesmo: ponderar perante a aprendizagem o que faz e o que deixa de fazer sentido.

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  18. Luna,


    Os direitos e as liberdades individuais são aquilo que a tradição e a cultura dizem que são. Como diria Zizek, os direitos humanos são mais os direitos do homem (macho) branco e ocidental do que propriamente direitos humanos. É claro que nem todas as tradições podem ou devem justificar todas as práticas, mas é preciso ter cuidado para não sermos nós os fundamentalistas.

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  19. Cuca

    estou-me a cagar para se os direitos são ocidentais ou não.
    O que me interessa saber é que direitos de escolha e libedade estas mulheres têm. E pelo que sei, são quase nenhuns. E muito menos relativamente ao homem, nas suas sociedades. E isto, lamento, não é não é relativizável.

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  20. E depois do que disseste, para quê acrescentar algo? Tradition? Tradition is no longer what it used to be. Desculpa fraquinha para justificar coisinhas atrozes.

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  21. Oi Luna, que interessante seu jeito de escrever. Muito boa sua reflexão sobre cultura... Gostei de ter chegado aqui. Virei mais vezes. Um abraço!

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  22. Olhe deixe-me dar.lhe os meu parabéns: finalmente volto a acreditar na raça humana!
    Por fim uma mulher se insurge contra os ataques que certo blog de nome Pipoco Mais Salgado faz ao género feminino; por fim uma mulher que não lê posts ofensivos sobre o sexo feminino e não deixa lá comentários de louvor e elogio, ganhou todo o meu respeito e admiração, porque como mulher andava indignada como podiam tantas bloggers anuir e condescender a tanta arrogância masculina. O autor do blog deve divertir-se imenso com o que escreve, e escreverá o que muito bem lhe apetece, mas que as mulheres achem tudo o máximo, mesmo que as ataque de forma tão baixa e vil, já me parece demais!!
    Obrigada, assim sempre durmo mais tranquila.
    Boa noite.

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  23. Liberdade o caracinhas (que nao quero dizer pior!!)! É uma liberdade espetacular! Alias, só saem de casa vigiadas, eles usam a palavra "acompanhadas", por um homem porque gostam muito!! É cool! E há coisas geniais como uma vitima de violacao ser acusada de atentado ao pudor! Ora pois claro! É óbvio que estava mesmo a pedi-las!!! Deve ser tradicao e o caracas!!

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  24. Venho aqui regularmente, mas não costumo comentar. No entanto, tendo acompanhado os posts q fazes, venho aplaudir a capacidade q tens de continuar esta luta, mesmo quando muita gente te considera chata e irritante, como já referiste, mesmo quando a maioria das pessoas se conforma. Irrita-me solenemente q as pessoas se acomodem aos problemas e ainda me irrita mais q se indignem mt quando aparece alguem como tu, q grita para o mundo ouvir q ESTÁ ERRADO.

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  25. Ainda à pouco estive num país com inúmeros turistas árabes. É revoltante ver a forma como tratam as mulheres. Elas estão de tal forma condicionadas que não podem nem conseguem lutar! Triste, muito triste e não chamem cultura ou tradição a algo que vai contra todos os direitos humanos.

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  26. tenho uma vizinha que aprece-me constantemente á frente toda tapada. Vejo-lhe a ponta dos dedos da mão e uns olhos perdidos no meio da escuridaõ. Confesso que sinto-me chocada quando passo por ela. Fico triste pela sua condição e custa-me aceitar que seja por sua opção, mas se o é, não me posso meter. Mas que me confunde, lá isso confunde.

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  27. Nós temos uma forma de pensar, eles têm outra. Qual é a certa?

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