3 de novembro de 2014

O problema dos homens

Continuarem a fingir desconhecer que se trata dos "lambia-te essa cona toda" atirados por estranhos na rua como forma de intimidação e não dos "bom dia minha senhora, está muito elegante hoje" proferidos com intenção de elogiar, a que nos referimos quando tentamos debater socialmente a questão do "piropo", continuamente desvalorizando e boicotando esse debate.

*Talvez a Emma Watson pudesse tornar o debate mais eficaz mostrando os grandes benefícios que traria ao sexo masculino a condenação do assédio sexual na rua, livrando os homens da pressão da sociedade patriarcal que os força a agir assim quando passa uma mulher, por não condenar socialmente esse comportamento e dessa forma o incentivar e perpetuar.  

**e já agora, o termo piropo é desadequado porque não reflecte a seriedade do problema e do que realmente se trata: assédio na rua.

40 comentários:

  1. Tens toda a razão, Luna. Infelizmente quando se falou de tomar medidas legais quanto à questão do piropo, houve uma onda de gozo e de desacreditação da seriedade do problema maioritariamente levada a cabo por mulheres, o que é extremamente triste.

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  2. Pois...
    O grande problema é mesmo esse... Não se sabe distinguir um piropo de uma ofensa verbal...
    Eu quase todos os dias dou os meus piropos às minhas colegas, sempre sem faltar ao respeito (acho eu...) e na optica de lhes aumentar a auto-estima, ou de as animar... Mas por vezes vejo cada anormalidade, comentários completamente desadequados, com quem não se conhece de lado nenhum, comentários que nem com quem se conhece se devem ter...
    Há piropos e piropos... E se os piropos elogios são algo a manter os "piropos" como aquele que referes no inicio do texto são absolutamente grotescos e são de evitar, e repugnar...

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  3. Aí é que está, o exemplo que deste não é um piropo, é assédio sexual, moral, u name it e é crime. A questão é distinguir assédio de piropo. E a fronteira é muito simples, é invasivo, agride, ofende? é assédio.

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  4. Luna, por muito que lhe custe, tem que saber aceitar, tranquilamente, que há quem não pense como a Luna, quem não esteja alinhado com a sua percepção da vida, quem valorize mais o que a Luna menos valoriza, quem, pelo contrário, não dê tanta atenção ao que para a Luna é um valor indiscutível. É a beleza da vida, aceitar que nem sempre as coisas são como a Luna acha que devem ser. E, asseguro-lhe, perceber o outro não lhe retirará um pingo de combatividade.

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    1. Dirijo-lhe o mesmo comentário a si.
      Com apenas um acrescento: antes de defender uma posição, pôr-se no lugar do outro e tentar pensar sobre o assunto, e, quiçá, tentar perceber a posição do outro e se o outro terá alguma razão, e por fim reflectir sobre qual das duas formas de estar e pensar contribuirá mais para um mundo melhor e mais seguro.

      Quanto ao aceitar que outros não valorizem um problema que nunca sofreram nem conhecem, e do qual nem conseguem atingir a dimensão e consequências, aceito perfeitamente. Tenho má opinião dessas pessoas e do seu egoísmo, e acho-as fundamentalmente pouco decentes moralmente, mas aceito.

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    2. E já agora deixe-me acrescentar que acho que beneficiaria muito o debate e a tomada de posição sobre o assunto, cada pessoa responder na sua consciência às seguintes perguntas:

      1- Concordo com a existência do assédio sexual e agressão verbal na rua?

      2- Concordo que uma pessoa que ande na rua seja sujeita a comentários de estranhos relativamente à sua aparência, o seu corpo, e as suas fantasias sexuais relativamente a esse corpo?

      3- Reconheço que é um problema social que causa incómodo, desconforto, insegurança e medo a uma grande percentagem da população?

      4- Concordo que, enquanto sociedade, devemos combater comportamentos intimidatórios e opressivos relativamente a uma faixa da população?

      5- Enquanto cidadão, sabendo que uma parte da população é afectada por um problema, é da minha responsabilidade tentar contribuir para a resolução desse problema mesmo que não me afecte directamente?

      Ou podemos simplificar resumindo tudo a uma única pergunta:

      Quero um mundo em que meninas de doze anos não tenham de ouvir diariamente "comia-te toda" e "boquinha de broche" quando andam sozinhas na rua ou não tem importância?

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    3. Luna, estamos de acordo, tenho a certeza, no essencial: é abjecto, censurável, miserável e nojento molestar seja quem for. Isto aplica-se ao velho que segreda obscenidades à miúda, ao tipo de t-shirt de alças que grita um "comia-te toda", ao tipo de óculos que se roça na mulher nos transportes públicos. Isto deve ser, tem que ser, combatido. Trata-se de invadir privacidade, de ser miseravelmente intrusivo. (bem sei que não aprecia o "eu já passei por isso" vindo do meu lado, mas acontecia-me muito, com quinze ou dezasseis anos ir correr para Monsanto e as senhoras da beira da estrada sugerirem que eu gastasse as minhas energias de outra forma)

      Outra coisa é a forma como se combate e como se vai ganhar a luta. Imagine que o piropo é criminalizado. Muda o quê, objectivamente? A mulher que é incomodada agarra no mafarrico e leva-o à polícia? O tipo percebe que é errado ser obsceno e muda o comportamento a partir do momento em que paga uma multa?

      O que há a fazer é mudar comportamentos, não extremando posições. Eu defendo que há uma forma de galanteio que não é intrusiva e insisto nesse ponto. E acredito que é por aqui, que faz mais uma boa campanha que ridicularize o tipo da t-shirt de alças, que transforme o obsceno e o intrusivo em algo que a sociedade, que os seus iguais, repudiem do que uma criminalização do piropo (que, como se vê, tem estado a ter um efeito de descentrar do tema).

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    4. Repare que eu nunca aqui defendi abertamente a criminalização do assédio verbal - acho o termo piropo extremamente errado. Eu não sei se a via da criminalização é a melhor solução, mas sei que a impunidade não tem resultado, e sei que o debate é importante para essa mudança de comportamentos de que fala, e que a constante desvalorização e desconversa relativamente ao assunto, para a qual o Pipoco tem activa e objectivamente contribuido, tem efeitos muito nefastos nesse debate.

      E, de facto, e estando convencida de que o Pipoco concorda comigo no essencial, não consigo compreender porque escolhe a desconversa. Qual o interesse? É pelo efeito provocador? A provocação é importante, desperta as consciências, é útil para catalisar a mudança de algo que está estabelecido, mas não neste caso e no sentido conservador de que fique tudo na mesma, ridicularizando um problema que enquanto sociedade devemos combater.

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    5. Luna, em vez de insistir no tópico "o Pipoco desconversa", já de si indicador que não há outra abordagem senão a sua, essa sim, construtiva, a "da conversa", aceite que tenho outro meio para chegar ao mesmo fim.

      E, francamente, muito mais eficaz que a sua abordagem, que afasta quem quer contribuir de outra forma, que reduz o círculo a meia dúzia de indefectíveis, que não gera senão um encolher de ombros e um "lá está a Luna outra vez naquilo. Que feitio, senhores...". A minha "desconversa" gerou opiniões muito mais construtivas, muito mais eficazes. A minha "provocação" (sabe lá o que sou eu em modo provador...) desperta comentários e induz atitudes.

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    6. A sério? Onde estão elas (as opiniões construtivas), que não vi nada?

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    7. p.s. o facto do Pipoco não gostar do meu estilo, e achar que só suscita encolheres de ombros, é a sua opinião pessoal, não reflecte forçosamente uma realidade: e a realidade é que ao longo dos anos já recebi muitos mails de pessoas a dizer que essa minha "abordagem" as fez pensar em assuntos em que não tinham pensado, ou mudado de opinião relativamente a um tema, etc; já debati muitos assuntos com pessoas com ideias diferentes, e já eu mudei de opinião ao ler outras perspectivas. E lamento, mas nunca vi nenhum debate realmente construtivo e mais eficaz no seu blogue. Mas isto é só a minha opinião.

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    8. Acredito sinceramente que a sua acção tenha despertado consciências. Incluo-me, de certa forma, nesse grupo.

      Vamos construir?

      Se sim, fazia-me falta perceber o que defende exactamente a Luna para começar a resolver o problema.

      i) Não defende abertamente a criminalização do assédio verbal. O que é isso do "abertamente"? Significa o quê? Defende ou não defende?
      ii) Acha o termo "piropo" errado. Devia ser substituído por que termo? E, se sei ler o que quer dizer, há uma questão de fronteiras e não de léxico. Que fronteira é essa que divide o aceitável do inaceitável, no que deve ser criminalizado e no que deve permanecer como está?
      iii) E deve-se ou não mudar também a atitude das mulheres? Quanto custa ser inflexível em vez de fazer de conta que não ouviu?

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    9. i) Não tenho certezas. A criminalização é de facto a solução mais imediata, mas acho que é um tema que deve ser debatido seriamente bem como apresentadas opções e soluções práticas: como está, que é impunidade total, sabemos que não está bem.

      Haver um enquadramento legal poderá ser um elemento dissuasor e ajudar à lenta mudança de atitudes e mentalidades, e a reprovação de um comportamento enquanto sociedade começa por torná-lo inaceitável aos olhos da lei, porque enquanto a lei os fecha e diz que não faz mal, a mudança torna-se mais lenta e difícil. Enquanto a lei permite um comportamento, a sociedade continuará a permiti-lo porque muda mais lentamente.

      Exemplos: as leis anti-racistas não eliminam o racismo, mas não legitimam comportamentos declaradamente racistas e como tal contribuem para que certos abusos não sejam possíveis de perpetuar.

      Da mesma forma, a aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo não acaba com a homofobia, mas diz à sociedade que perante a lei aquelas pessoas têm os mesmos direitos, e não devem ser discriminadas com base na sua orientação sexual.

      ii) Acho o termo inglês "street harrasment" muito mais apropriado, em português optaria talvez por "assédio verbal". Quanto ao que deve ser considerado assédio, a Isa responde bem "é invasivo, agride, ofende? é assédio."

      Toda a gente que já foi vítima desse tipo de comportamento - até o Pipoco - sabe distingui-lo muito bem. Quanto aos detalhes, não sou jurista, mas creio que seria possível determinar essas fronteiras, há outros tipos de assédio contemplados por lei, injuria, etc.

      iii) sim, a mentalidade das mulheres tem de mudar e muito a vários níveis: há uma espécie de síndrome de estocolmo que faz com que o hábito de se ser assediada na rua se confunda com valorização, e aumente a auto-estima.

      E repare, eu já sofri desse efeito na pele: quando fui para a Holanda e deixei de ser assediada na rua - sim, é possível, há países onde isso é realmente raro - comecei a achar que devia estar mais feia, ou assim. Isto porque me tinha habituado a achar esse comportamento normal, e depois desse choque inicial e de "sentir falta", foi absolutamente libertador saber que podia andar à vontade na rua sem ser incomodada, sentir que não tinha de evitar vestir certas coisas ou passar por certos sítios.
      Posto isto, sim, há uma primeira mudança necessária: a de reconhecer o assédio como o que ele é, e não confundi-lo com validação.

      Quanto a passar do ignorar ao confronto directo com o ofensor, é difícil ultrapassar o medo porque há sempre o perigo de se poder ser agredida fisicamente ou ainda mais insultada. Esse perigo não desapareceria com a criminalização, a diferença é que se uma mulher se sentisse intimidada com esse comportamento, teria a protecção da lei, hoje em dia não pode mesmo fazer absolutamente nada, tirando comer e calar.

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    10. Adenda:

      Acabei de ler no Jugular exemplos de situações de ofensa contempladas por lei que irei transcrever, e que demonstram que é possível estabelecer critérios relativamente ao que poderá ou não ser considerado assédio, e que no caso de criminalização do assédio de rua, tal como em outros crimes que dependam de queixa, é às instâncias judiciais q caberá fazer a destrinça.

      190.º - violação de domicílio ou perturbação da vida privada

      1 - quem, sem consentimento, se introduzir na habitação de outra pessoa ou nela permanecer depois de intimado a retirar-se é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 240 dias.
      2 - na mesma pena incorre quem, com intenção de perturbar a vida privada, a paz e o sossego de outra pessoa, telefonar para a sua habitação ou para o seu telemóvel.

      artigo 251º ultraje por motivo de crença religiosa

      1- quem publicamente ofender outra pessoa ou dela escarnecer em razão da sua crença ou função religiosa, por forma adequada a perturbar a paz pública, é punido com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias.

      ofensa à memória de pessoa falecida (artigo 185)

      1 - quem, por qualquer forma, ofender gravemente a memória de pessoa falecida é punido com pena de prisão até seis meses ou com pena de multa até 240 dias


      Ora, ofensas por motivos religiosos ou à memória de pessoas falecidas podem ser punidas por lei, mas alguém na rua gritar a uma desconhecida como a gostava de comer por trás já não?

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  5. Hear hear! Subscrevo inteiramente. Há uma diferença do dia para a noite entre o piropo, e o "monstro" verbal que assedia, enoja, e intimida - só de ler essa frase do "lambia-te..." não consigo deixar de reagir com um esgar de repulsa e nojo. Há que educar a sociedade, (muitas mulheres incluídas), sobre o que é o piropo e o "not piropo".

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  6. Concordo! - e qual será a mulher que nunca sofreu desse tipo de assédio? chamar-lhe piropo é errado (porque não é, de todo, um piropo quando um energúmeno se dirige a mulheres com esse tipo de abordagem).

    E é como li no outro dia, algures... a grande maioria dos homens não entende porque nunca passou por tal, e estes caramelos não mandam estas bocas de extremo mau gosto quando uma mulher / rapariga vai acompanhada por um homem / rapaz (portanto, para alguns homens tudo isto são meros devaneios femininos).

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  7. Pois eu acho que devia ser penalizado e bem penalizado. Qual é o problema de uma multa? Mas porque raio é que temos que ser tolerantes com uma agressão verbal?

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  8. E devia haver criminalização de outras coisas, como deitar lixo para o chão, urinar na rua e insultar pessoas no trânsito. As pessoas têm que aprender a ser civilizadas. Se são uns selvagens por natureza, têm que aprender à força que para isso serve o facto de "sermos civilizados". Se não somos civilizados sofremos consequências. Simples assim.

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    1. Urinar na rua leva multa na Holanda, pensei que cá também levasse.

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    2. também leva... é preciso é seres apanhado, ou n se considerar mijar na rua coisa de macho, aí a polícia deve deixar passar...

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  9. O problema é o piropo mudar de nome conforme quem o profere, como o profere, e quem o ouve e como o ouve. Por isso é que o largam a torto e a direito.

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  10. Habitualmente não gosto de neo-criminalizacões. Mas parece-me que faz todo o sentido a criação de um tipo legal onde caiba o assédio sexual, aqui se incluindo o assédio verbal. Claro que é preciso não ser fundamentalista, deixando de fora da punição expressões sem caráter sexual.

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  11. O problema na discussão destes assuntos são sempre os exageros. Não me parece defensável pretender alargar a punição a expressões que não tenham cariz sexual.
    (Outra hipótese é passar a ser contraordenação)

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  12. Luna, fiquei sem perceber se o meu comentário foi enviado.
    Falava do vídeo da tal moça que andou por NY e de como os comentários me assustaram. Ou as pessoas são muito naive e acreditam piamente que eram apenas elogios inocentes ou só querem mesmo embirrar com qualquer tipo de tentativa de debate desta problemática.

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    1. Não encontro o comentário, por vezes por engano vão parar ao spam, mas não foi o caso. Mais uma das avarias do blogger, imagino.

      Citando o texto da Fernanda Câncio, "O que o vídeo evidencia é o carácter repetitivo, importunador, exasperante do "piropo". Mostra como sair à rua é, para qualquer mulher, um estado de alerta permanente, o de quem sabe que a qualquer momento pode ser abordada por um estranho com ofertas de sexo e sujeita a apreciações, mais ou menos alarves, sobre o seu aspeto. O que os dois vídeos demonstram é que o chamado "piropo de rua" é uma forma de agressão e portanto - não tenhamos medo das palavras - de intimidação e dominação das mulheres. De lhes tornar claro que na rua não estão seguras; que a rua não é delas; que se "habilitam". "

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    2. Olha aqui um exemplo perfeito da reacção masculina, de como é totalmente ao lado e, até, absurda, já não falando de eivada de uma insensibilidade atroz:
      http://www.upworthy.com/watch-a-man-try-to-tell-women-what-their-problems-are-and-see-how-that-works-for-him?c=ufb1

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    3. “My dear, a lack of compassion can be as vulgar as an excess of tears”

      - Lady Violet Crawley, Downton Abbey

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  13. Não sei o que pensar sobre esta questão. As bocas são desagradáveis? São. Deixam-me desconfortável? Deixam. Mas hey, eu é que "escolhi" desde pequena ignorar os ditos e seguir em frente. Eu é que escolhi agir passivamente e não ripostar. Claro que não foi uma escolha pensada, foi um não saber melhor na altura. Mas cresci a ignorar porque nunca soube dizer "cara***" na devida altura (como vês, nem na internet eu consigo utilizar este palavreado sem o censurar, lol). Não acho que seja responsabilidade da lei cobrir esta minha incapacidade de me defender dessas bocas sujas. Acho que tem de partir de mim alguma mudança. Quando tiver disponibilidade para tal meto-me numas aulinhas de defesa pessoal (só ficamos a ganhar com isso). Entretanto tenho que aprender a dizer "vai pró cara***" como gente grande.

    Ah, e lá por biológica e estatisticamente o homem ser mais forte que a mulher não quer dizer que não sejamos capazes de sovar algum que se mete connosco.

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    1. Peço desculpa, Vanessa, se calhar sou mais antiga, mas eu cá não 'escolhi' nada quanto à minha reacção de ignorar e calar. Fui coagida, porque não tinha corpo, nem experiência de vida, nem à-vontade para fazer frente a homens com o dobro da minha idade (comecei a ouvir 'piropos' com uns 12 anos, que me apercebesse). Fui ensinada a não reagir, porque se o fizesse arriscava a ser mais insultada ou até agredida - que os piropadores não actuam às claras, e aproveitam-se de circunstâncias que isolam a piropada. Uma vez, uma amiga minha reagiu. Tinha 15 anos, o piropador idade para nosso avô. Foi insultada em voz alta e com muito à-vontade pelo velhadas. Portanto, não optei coisa nenhuma.

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    2. Vanessa, essa forma de pensar está errada, embora esteja muito entranhada culturalmente, porque culpa a vítima. É como quando uma mulher é violada e se pergunta o que levava vestido.
      O assédio verbal na rua é um comportamento errado da parte de quem o faz, não das vítimas, pelo que mais que exigir a mudança de comportamento por parte das vítimas, devemos pedir a mudança de comportamento por parte do agressor.
      Enquanto sociedade não devemos tolerar esse comportamento nem esperar que parta da vítima achar que tem de recorrer a aulas de auto-defesa para se poder defender no caso de confronto.
      A Vanessa pode mudar, se quiser, se isso a fizer sentir menos humilhada pode decidir confrontar quem a ofende, mas em nenhum momento a culpa é sua por ter "escolhido" ignorar.

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    3. Também levei uma vez um chapadão na tromba num autocarro por ter reagido quando um rapaz veio incomodar uma amiga, devia ter uns 14 ou 15 anos.

      Outra vez, por ter recusado a boleia de um velho e que pelos vistos sabia quem eu era e onde vivia - terras pequenas - me fez uma espera no mecânico da minha rua e me chamou todos os nomes e mais alguns e ainda insultou os meus pais enquanto eu a descia para ir para casa, onde cheguei a tremer sem me aguentar nas pernas ao ponto da minha mãe sair disparada e ir descompor o homem, que nunca mais me incomodou.
      Mas nada disto são escolhas, e a capacidade de confronto só vem geralmente mais tarde, com mais idade, quando já nos sentimos menos vulneráveis. Curiosamente, é nessa idade em que deixamos praticamente de ser assediadas, porque um dos factores que dá pica a quem o faz é exactamente o medo que as suas vítimas indefesas - geralmente rapariguinhas novas - sentem.

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    4. Izzie, ora essa, não tem que pedir desculpa, acho que todos estamos aqui com o único objectivo de partilhar pontos de vista para podermos extrair algum ensinamento útil.
      De facto eu não senti essa coacção, e não disse que tinha sido opção minha ignorar, foi antes um não saber melhor, exactamente por esses factores que refere: a idade, experiência de vida, não saber exactamente o que é que se estava passar (tão novinha, eu sabia lá). Não me lembro de estes assuntos serem alguma vez abordados em minha casa, tudo o que me lembro é de a minha mãe a advertir-me "cuidado com os carros e não fales com estranhos", e a forma como eu sempre lidei com comentários dessa espécie não me foi ensinada, eu é que por mim sempre decidi não dar resposta. Agora, se foi por medo ou não, não sei. Sei que hoje em dia não é medo que me faz ficar calada, mas se calhar na altura podia ser.

      Luna, eu não me sinto humilhada quando ouço "piropos", pelo menos não no sentido de ficar afectada psicologicamente por aquilo que o outro diz. Sinto-me é estúpida por não conseguir fazer frente, não conseguir de alguma forma repor a minha dignidade, mesmo que através de uma caralhada. Acho que ripostar, desancar o outro verbalmente, talvez rir na cara dele, enfim, ridicularizar o acto, é uma forma de repor a minha dignidade e ainda pode fazê-lo ver que aquilo não é comportamento aceitável. Nós temos a capacidade de pôr as pessoas no seu lugar quando assim tem de ser, e sem qualquer recurso à lei; por que não poderemos fazê-lo aqui também?

      Compreendo o que diz sobre o sentimento de culpa, e realmente podia ver isso assim, mas acho sinceramente que não é isso que sinto, porque a culpa de que falo é por não conseguir responder de volta, não é por acreditar que o outro tem legitimidade para me atirar com o "piropo".

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  14. Quando era mais novinha, chegava a ter medo de sair à rua ou de estar sozinha num café. Isto não é limitativo? Não é um problema social? A mim parece-me uma conspiração para impedir as mulheres de sairem de casa. Por favor, não confundam um elogio com assédio. Quem confunde, certamente nunca passou por isso!

    Cheguei a ser perseguida por um grupo de energúmenos metidos num carro, à noite, enquanto fazia a pé um percurso de volta para casa. Mas se calhar a culpa é minha, meninas decentes e de boas famílias não deviam andar por aí sozinhas de noite.

    Muitos outros episódios podiam ser contados, não só por mim, mas por qualquer mulher. A quem não entende e ainda ridiculariza, desejo que lhe aconteça o mesmo, todos os dias da sua vida, até perceber. (Se bem que uma semana deve chegar.)

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    1. Há uns tempos, na Turquia, um homem mascarou-se de mulher e passeou-se pelas ruas já não me lembro de que cidade, se Istambul ou Ankara. Ao fim do dia, disse que não consegui conceber como é que as mulheres aguentavam viver aquilo todos os dias da sua vida.

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    2. Aqui está:

      https://www.youtube.com/watch?v=Az1DsRo6QX4

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    3. Errata: foi no Egipto e não na Turquia.

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    4. Luna, se tiveres tempo e oportunidade, vê o filme Cairo 678, sobre assédio sexual no Egipto. Trailer: http://www.youtube.com/watch?v=COesFcvkXaE

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    5. Obrigada pela dica, só o trailer é fortíssimo.

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